Reaproximação entre Cuba e Estados Unidos

A recente reaproximação entre Cuba e Estados Unidos pode render especulações sobre a relação entre esses países no passado que podem ser exploradas em vestibulares e no Enem

Por Cláudio Fernandes
Mãos em sinal de solidariedade representando as bandeiras dos Estados Unidos e de Cuba
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O dia 17 de dezembro de 2014, os Estados Unidos da América (EUA) e Cuba tornaram públicas suas intenções de reaproximação diplomática. O anúncio desse começo de abertura de relações políticas entre os dois países veio acompanhado de negociações para libertação do americano Alan Gross, em Cuba, bem como a libertação de três cubanos na Flórida (EUA), acusados de espionagem. Tanto o líder cubano, Raúl Castro, como o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, discursaram sobre o fato da libertação desses indivíduos e assinalaram a perspectiva de uma nova fase entre os dois países. 

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Esse acontecimento tem uma relevância notória (e, por isso mesmo, vem sendo amplamente noticiado na imprensa internacional) exatamente por terem sido publicamente declaradas as intenções de reaproximação. Contudo, a história da relação entre Cuba e EUA, desde os anos 1960 até agora, é marcada por várias contradições, tanto de um lado quanto de outro. As contradições começam logo com as investidas revolucionárias do grupo liderado por Fidel Castro, na década de 1950, contra o governo de Fulgêncio Baptista. Há já um longo debate historiográfico que esmiúça, nesse contexto, a participação dos EUA tanto em apoio às forças de Baptista quanto em eventuais auxílios aos guerrilheiros. 

Ademais, no contexto da Guerra Fria, a Revolução Cubana só representou, de fato, um ícone do comunismo na América Latina quando começou a estreitar relações com a União Soviética no início dos anos de 1960. Até 1959, quando os revolucionários ocuparam Havana e empossaram Manuel Urrutia Lléo presidente — um advogado com tendências ideológicas liberais —, os rumos de uma “Cuba comunista” e de uma “luta contra o imperialismo Ianque” ainda não haviam sido plenamente traçados. Essa perspectiva só se definiu quando os irmãos Castro assumiram de fato o controle da ilha, tanto político quanto econômico e militarmente, optando pelo apoio ao bloco soviético. 

Essa opção de Cuba implicava, naturalmente, rechaçar a estrutura econômica americana que havia na ilha há décadas. As “plantations” e os demais investimentos americanos em Cuba foram desapropriados ou expropriados pelo Estado comandado pelos Castro. A institucionalização de uma burocracia gerenciadora do país, estatizante e profundamente dependente da URSS, valendo-se da retórica revolucionária socialista, provocou a reação do bloco ocidental, sobretudo dos EUA, que, a partir de 1961, romperam relações diplomáticas com Cuba após o episódio da invasão da Baía dos Porcos. O momento mais crítico e tenso da Guerra Fria no que se refere à relação EUA-Cuba foi o da Crise dos Mísseis, que pode ser consultado neste link. 

Com a queda do bloco soviético em 1989 e as reformas estruturais na Rússia e nos demais países, as relações entre Estados Unidos e Cuba passaram a tomar outro rumo. Cuba foi submetida à pressão de embargos econômicos na forma de duas leis principais: A Lei Torricelli, de 1992, e a Lei Helms-Burton, de 1996. Essas leis dificultavam a articulação econômica de empresas que tinham ou queriam estabelecer negócios em Cuba, já que esse país não contava mais com o auxílio soviético. Além disso, há ainda a posição dos emigrados cubanos que vivem nos EUA. Essa comunidade cubano-americana possui opiniões bastantes diversas e contundentes com relação aos embargos. Enquanto uns apoiam o seu fim, outros defendem a sua manutenção como forma de pressão para a ruína do regime instalado pelos Castro. 

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A partir dos anos 2000, houve uma maior flexibilidade com relação às parcerias econômicas entre Cuba e diversos outros países, incluindo o Brasil e os EUA. Recentemente, o financiamento do Porto de Mariel em Cuba pelo governo brasileiro repercutiu enormemente, sobretudo por conta de acusações em torno da obscuridade na prestação de contas de tal empreendimento. Mas o fato é que Cuba tem buscado manter-se “de pé” politicamente, segurando a moldura de um regime autoritário, ao mesmo tempo em que se articula economicamente como pode e com quem pode. A renúncia de Fidel Castro trouxe mais uma reviravolta a esse cenário, e seu irmão, que sempre foi considerado mais radical e mais ligado ao núcleo duro das Forças Armadas cubanas, vem demostrando, contraditoriamente, essa perspectiva de abertura. Essa postura talvez seja influenciada por uma articulação política que leva em conta a idade avançada tanto de Fidel quanto do próprio Raúl Castro e dos demais membros da elite dirigente de Cuba. O regime precisará ser reformado nos próximos anos; e ao que tudo indica, Raúl Castro deve estar preparando uma nova elite para isso, como acentua o pesquisador Maurício Santoro, no trecho a seguir:

“Expectativas moderadas e uma clara noção dos limites do possível podem levar à melhoria expressiva das relações entre Estados Unidos e Cuba, abrindo possibilidades positivas para o futuro imprevisível após a morte dos irmãos Castro. A ausência de uma figura pública com legitimidade comparável à dos líderes revolucionários pode criar um perigoso vácuo político, com o risco de disputas violentas pelo poder. Nesse contexto, faz sentido que Washington aposte na construção de vínculos de confiança com altos funcionários do governo cubano, nas esferas diplomática, militar e econômica, que seriam de grande valia num cenário turbulento como esse.” (SANTORO, Maurício. Cuba após a Guerra Fria: mudanças econômicas, nova agenda diplomática e o limitado diálogo com os EUA. Rev. bras. polít. int., Brasília, v. 53, n. 1, July, 2010. p. 138)

Ademais, é preciso ficar atento à situação atual de Cuba, às principais reivindicações da população cubana, aos motivos de haver tanta evasão do país e ao interesse que a comunidade econômica internacional, incluindo o Brasil, tem na ilha. Essas podem ser as principais especulações que os vestibulares e o Enem poderão explorar no ano que vem.